Estudantes, docentes e técnicos protestam na UnB pelas liberdades democráticas.
A primeira ação da ditadura militar brasileira ao tomar o poder em 1964 foi invadir, incendiar e metralhar a sede da União Nacional dos Estudantes - UNE, o regime militar através da Lei Suplicy de Lacerda, proibia as atividades políticas nas organizações estudantis e controlava essas unidades, as universidades então passaram a ser vigiadas, intelectuais e artistas passaram a ser reprimidos. Contudo, apesar da repressão, a UNE continuou a existir fora da visão dos opressores, firmes em oposição ao regime, porém com o fortalecimento da repressão sobreveio mais episódios de torturas e de assassinatos com os estudantes, com a proclamação do Ato Institucional número 5 (AI-5) torturas, assassinatos, perseguições e violações dos direitos humanos agora eram institucionalizados, essa tentativa de endurecimento foi justamente porque a ditadura não estava conseguindo manter o controle da sociedade; inconformados com o autoritarismo e repressão, muitos estudantes tiveram que ser corajosos para enfrentarem as forças repressoras, eles lutavam por um mundo melhor e mais justo, defendendo a liberdade e os direitos humanos.
Anivaldo Padilha, estudante universitário, militante da ação popular (AP), líder da juventude metodista e da articulação ecumênica foi preso e torturado carregando consigo memórias fortíssimas sobre o tempo em que foi mantido prisioneiro, Anivaldo diz que começou a ser torturado assim que chegou, e um dos piores carrascos do DOI-CODI lhe falava ‘Começa a falar porque a guerra acabou para você. Se não falar o que sabe, vai virar presunto’ termo que o esquadrão da morte utilizava para os mortos que encontrados em São Paulo, assassinados pela polícia; ao negar-se a passar informações sobre outros estudantes militantes e as suas reuniões e organizações, ele passou a ser vítima de tortura constante, em seus relatos muito forte sobre o que lhe ocorria durante o seu tempo encarcerado, Anilvado revela que durante a tortura ele havia entrado em crise, e que o ato institucional possibilitou a fase mais sangrenta e autoritária do golpe militar, estabelecendo um regime de terror no Brasil muito pior do que ocorrera após 1964. Após os militares não conseguirem comprovar relações de Padilha com organizações clandestinas, ele foi liberado, porém, com medo de ser preso novamente e de prejudicar sua família, ele foi obrigado a exilar-se e retornou ao país apenas em 1984, diante desse relato, busco mostrar a participação central dos estudantes no cenário político, os estudantes foram umas das principais forças de oposição à ditadura militar no Brasil, pois ousaram em se contrapor diante daquelas leis repressivas e mostraram uma grande capacidade de mobilização social, batalhando profundamente na cultura nacional em busca da conscientização e pelo engajamento da juventude brasileira.
No livro “As Universidades e o Regime Militar” de Rodrigo Patto Sá Motta o autor discorre sobre a problemática chamada por ele de “influxo político da cultura brasileira”, que tem como base entender a tradição de conciliação e negociação, e a tendência de acomodação de determinados grupos, com projetos contraditórios, especialmente no processo de transição para a democracia, nisto o autor percebe uma dualidade de posição política do Estado, pois ao mesmo tempo em que eram autoritários, era também convincente, como por exemplo o fechamento da assessoria de segurança e informação (ASI) e a Anistia oferecida pela lei nº 6.683/1979, para a reintegração dos professores perseguidos pelo regime militar, entre o final da década de 1960 e início de 1970 o autor identifica também uma alta no investimento científico e tecnológico entre as instituições de ensino superior públicas, bem como a expansão de cursos de graduação e pós-graduação nas instituições privadas, e o resultado desse processo reformista é a vigilância das ciências sociais, que consumia de maneira superficial os conceitos marxistas, acompanhadas de uma influência norte-americana, todavia para o autor “o argumento é que as escolhas podem sofrer a influência da cultura política, que oferece aos agentes alguns padrões de ação já inscritos nas tradições, mais atraentes e viáveis por terem gerado sucesso em ocasiões anteriores. Por outro lado, embora cultura política implique relações sociais, valores e imaginários estruturados, bem enraizados na sociedade, isso não significa a impossibilidade de mudança. Aliás, talvez a grande crise atual seja o começo de mudanças estruturais na cultura política.” (MOTTA, 2018)
Após a escalada da repressão (1969-1975) o movimento estudantil conseguiu se recuperar aos poucos dessas tentativas de silenciamento, com a reconstrução de suas organizações, o movimento voltou a mobilizar os estudantes que voltaram às ruas para exporem suas reivindicações pelo ensino público e pelas liberdades democráticas, apesar de terem dado o pontapé inicial nas lutas por liberdades democrática, o movimento sindical e os movimentos populares acabaram assumindo um protagonismo maior no final do regime, os universitários ao longo de sua luta deixaram claro que para haver transformações profundas na sociedade brasileira, era importante a participação das outras classes em sua luta e sua própria participação na luta de diversos outros segmentos da sociedade, os estudantes estavam presentes nas manifestações e nas periferias contra a carestia, atuaram ao lado de trabalhadores nas manifestações sobre os direitos dos trabalhadores no dia 1 de maio, caminharam ao lado dos movimentos femininos, sendo solidários a diversos momentos de resistência, e ao final da ditadura lutavam pela anistia.
Apesar das reivindicações pelo ensino público, o governo civil-militar germinou um sistema universitário que ainda vigora até os dias de hoje, de um lado um sistema minoritário de universidades públicas que comportam uma elite de pesquisadores e alunos de maior renda e capital acadêmico/cultural e de outro um setor de universidades privadas, que fora algumas exceções não possui condições econômicas e acadêmicas para alcançar o mesmo patamar do sistema público, seja através de suas pesquisas ou de sua qualidade de ensino, sem contar a disparidade de alunos oriundos de escolas particulares ocuparem a maioria das vagas das universidades públicas, enquanto milhares de estudantes que receberam uma formação mais precária ocuparem as faculdades particulares. Atualmente ainda há universidades que não se disfizeram completamente dos seus estatutos e regimes autoritários, como por exemplo a USP que ainda mantem diretrizes que normatiza a perseguição política, embora a comunidade universitária frequentemente tem manifestações de repúdio a este anacronismo, mesmo nos dias de hoje ainda estamos vivenciando uma crescente militarização de um novo regime, no qual o autoritarismo se exerce de maneira sútil, disfarçando-se de democracia e o AI-5 continua sendo perpetuado pelo Estado Brasileiro, a política de tortura, de desparecimento e de execução ainda continua sendo praticada contra a população jovem e negra nas periferias das grandes cidades, indígenas e quilombolas também sofrem com a violação de direitos humanos, sendo marcados pelas graves violações de direitos humanos.
Escrito por Rayssa Pereira, estudante de História
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