A ditadura no Brasil foi responsável por um período sombrio na construção social brasileira e como ela vinha se desenhando. Por muito justificada para combater a ameaça comunista em todo o escopo da América Latina, mas o que ela realmente objetivava era a afirmação de uma autocracia burguesa sobre os caminhos que o povo vinha trilhando em busca de sua emancipação para vivenciar uma realidade mais igualitária.
Não obstante, o período ditatorial influiu sobre o serviço social em uma série de transformações que buscavam o rompimento com um papel tradicional e vinculado ao controle do Estado sobre a classe trabalhadora herdado de instâncias do passado ligadas diretamente a esta função de subserviência da profissão aos interesses da classe dominante. No que antecede ao golpe, a profissão vinha racionalizando o papel de sua atuação com perspectivas modernizadoras, em comunhão com o anseio popular por mudanças na ordem de dominância que era presente na realidade da época.
Efetivamente, o golpe de abril causou um curto-circuito que gerou, no campo profissional, a ruptura com os vetores críticos que estavam embaçando a perspectiva de mudança que ocorria. No período de 1964 a 1968, o que se apanha é um lapso da memória que justificava a perspectiva de mudança, um esvaziamento do que fora construído por meio da censura nas universidades e de todo e qualquer abarco teórico que fosse tido contrário ao que era defendido pelos conservadores na época.
Contudo, o que de fato ocorreu após 1968 é que as mudanças sofridas no campo da atuação profissional do curso permitiram que os estudantes dentro das universidades observassem de forma mais crítica o papel que cumpriam perante a sociedade e se organizassem para o fortalecimento de um projeto que visava a romper com a tradição burguesa que vinha sendo imposta sobre seus profissionais. Foi então no seio do movimento universitário que surgiu e foi abraçado um senso de revolução para com a forma que o trabalho dos assistentes sociais se dava.
O movimento estudantil foi o primeiro lugar onde se manifestou o projeto de ruptura. Foi durante esse movimento em prol da ruptura com o tradicionalismo antes vigente que o serviço social rompe seu isolamento intelectual e passa a beber de teorias e visões sociopolíticas adversas ao pensamento liberal que antes o fomentava. Apesar de sua forte e intensa mobilização, as vias de poder geridas pela ditadura impuseram um forte obstáculo para a consolidação da ruptura. O processo de luta e mobilização vai desde os anos 1970 até o final dos anos 1980. Essa quantidade de tempo mostra como foi complexo para que, em meio a uma ditadura, a profissão se mobilizasse de forma segura para que sua modernização não fosse cerceada pelas forças inibitórias da ditadura.
A presença de militares em eventos e reuniões que tratavam da reestruturação do curso e de seu projeto para com a sociedade foi recorrente e, assim, inibiram a consolidação prévia da ruptura. Porém, a força com a qual a mobilização estudantil adjunta dos setores de atuação profissional foi tamanha que em 1979 ocorreu um congresso profissional que pavimentou o caminho para as transformações profissionais ocorridas após a redemocratização, chamado congresso da virada. Ele marca um ponto crucial para a retomada da modernização do curso e da profissão e uma grande vitória perante o regime ditatorial que regia o país.
A existência da classe como aliada aos interesses da população, e não da burguesia, contendo uma visão que busca a conquista de direitos sociais, políticas públicas e ao combate das expressões da questão social só é possível, hoje, graças a luta e a resistência de diversos profissionais que durante a ditadura se posicionaram e lutaram pela reforma na categoria.
Bibliografia:
NETTO, José Paulo. O Movimento de Reconceituação: 40 anos depois. In: Revista Serviço Social e Sociedade. Nº 84 – ANO XXVI. São Paulo: Cortez, 2005
NETTO, José Paulo. Ditadura e serviço social: uma análise do serviço social no Brasil pós – 64. 8ed. São Paulo: Cortez, 2005.
Imagem capa em: http://www.cfess.org.br/visualizar/noticia/cod/1032
Escrito por João Otávio, estudante de Serviço Social
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