“Não foi uma ditadura, foi uma revolução”, falam alguns. Como bem dizia Raul Seixas, “parem o mundo que eu quero descer''. Isso mesmo, Raul. Essa é a sensação que nos é causada quando frases como essas são ditas para se referir a um dos períodos mais conturbados da história brasileira. Acreditar na ditadura como um processo revolucionário é, sem dúvidas, uma afronta aos que derramaram sangue nas ruas lutando contra a censura, o fim dos direitos humanos e, sobretudo, aos que lutaram para restabelecer no país uma valiosa democracia. Tomada do seu povo pelo regime ditatorial.
Em todos os estados brasileiros havia rastros da ditadura militar que se iniciou em 1964, os reflexos do novo regime de poder ecoavam por todo país. A centralização do poder fazia com que medidas severas fossem tomadas, medidas essas que afetaram todos os setores sociais. Os ecos da ditadura invadiram as salas de aula em todo o território nacional. Na Bahia, por exemplo, não foi diferente. Já nos primeiros anos do regime militar, educadores e estudantes foram perseguidos, calados, expulsos, presos, exilados e alguns até assassinados, isso porque não se calaram diante do governo extremamente autoritário que os vigiava.
As políticas educacionais naquele período da nossa história possuíam dois grandes objetivos: o primeiro era a formação da mão de obra adequada ao modelo de desenvolvimento econômico dos militares, o segundo era fazer com que as escolas, professores e estudantes difundissem uma ideologia favorável ao regime. Os espaços escolares deixaram de ser um lugar de liberdade na medida em que se tornaram espaços de imposição de padrões de comportamentos que deveriam ser seguidos. E sim! Tinham que ser seguidos. Muitas vezes, obedecer às imposições durante a ditadura militar era sem dúvidas uma estratégia de sobrevivência. Piedade era uma palavra que não fazia parte do vocabulário dos militares que estavam no poder.
A expansão do sistema escolar público, com vistas à universalização do 1º grau, era uma exigência importante do desenvolvimento do capitalismo monopolista e foi a principal medida da Reforma do Ensino na ditadura. De fato, a rede de escolas expandiu-se significativamente no período. Mas esse crescimento não foi acompanhado dos investimentos necessários. Tanto que, em 1982, quase no fim da ditadura, o Banco Mundial divulgou um estudo em que o Brasil aparecia como o país da América Latina com menor percentual de gasto público na educação: apenas 6,5% do PIB. O Haiti, penúltimo colocado da lista, gastava 11,3% (dados do PNAD, The World Bank, 1982).
O resultado dessa política desastrosa foi a rápida deterioração da qualidade do ensino. Com isso veio a redução nos salários dos professores, a contratação de docentes sem formação adequada e a falta de materiais básicos requeridos no cotidiano escolar.
Não era incomum, por exemplo, que em algumas regiões do país fossem contratadas pessoas que tinham apenas o 1º grau completo para lecionar neste mesmo nível de ensino. Sem contar que as escolas passaram a ser monitoradas 24 horas por dia. Esse mecanismo foi utilizado como subsídio para monitorar o comportamento da equipe escolar, principalmente no acompanhamento dos assuntos que eram estudados dentro da sala de aula.
É importante lembrar que o regime militar não tinha a intenção de cumprir qualquer requisito humanista ou proporcionar o pleno desenvolvimento intelectual dos novos ocupantes dos bancos escolares. Antes de qualquer coisa, tratava-se de garantir a formação de trabalhadores minimamente letrados, garantir que tivessem conhecimento mínimo em operações matemáticas simples e soubessem um pouco da leitura e da escrita. Ou seja, para o capitalismo brasileiro, importava que as classes trabalhadoras se apropriassem de habilidades intelectuais básicas para incrementar o processo produtivo do capital. Oferecer uma educação de qualidade era correr o risco de que as pessoas pudessem, num futuro próximo, rejeitar essa ideia de produção do capital imposta pela ditadura militar.
Tenho dito aos que costumam atestar que a ditadura foi uma revolução que ainda resta um longo caminho a percorrer para que compreendamos o que foram os 21 anos de domínio militar sobre o país. Foi um tempo de terror. Gerado, desenvolvido e praticado pela ditadura.
Escrito por Abel Amado, Mestrando em História-UEFS
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