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Foto do escritorMemória e Ditadura nas escolas do DF

A prostituição na ditadura militar: os dois lados da moeda


Foto: The Intercept Brasil


A prostituição na ditadura militar constitui uma questão relevante. Abrange um grande amontoado de acontecimentos bárbaros que, assim como a maioria dos feitos absurdos do regime, foram propositalmente velados e tornaram-se desconhecidos por meio de processos secretos e documentos confidenciais. Além das barbaridades, poderemos perceber ao longo do artigo as contradições que, embora não sejam novidade, ainda chocam quando nos são apresentadas.

Na década de 1970, período em que o crescimento urbano e o êxodo rural eram constantes em diversos estados do Brasil, aumentava, também, a ocupação das zonas periféricas nas cidades brasileiras. Grande parte das mulheres, que se encontravam em situação de pobreza, sem estadia e viviam nessas periferias, acabaram adotando a prostituição como forma de remuneração. Por conta da forte imposição moral promovida pela ditadura, calcada no imaginário conservador e cristão, essa prática foi permeada de preconceitos, estigmas, corrupções e violências.

Desde o início do regime, não só as Forças Armadas como também as polícias Civil e Militar atuavam na repressão às prostitutas da época, fazendo com que as mesmas fossem alvo de diversos tipos de tortura, exploração sexual e perseguições. Muitas foram presas, outras tantas foram mortas e as que, por sorte, sobreviveram acabaram vivenciando um cenário de medo e insegurança, não tendo a quem recorrer. Nos anos de chumbo (1968-1974), a perseguição crescia e era contínua, o termo “vadiagem” era usado como justificativa para a prisão dessas pessoas que atuavam como profissionais do sexo. Em certas ocasiões, nas prisões, as prostitutas tinham permissão para sair em horários e locais específicos e eventualmente recebiam escolta, considerando que cafetões e cafetinas não raramente estabeleciam relações amistosas com as forças de segurança.

Paralelamente a isso, outra questão merece grande atenção para conhecermos uma outra face do que diz respeito à prostituição na ditadura militar brasileira. Trata-se da dualidade dentro do regime militar e sua atividade corruptiva. Se, de um lado, tínhamos um regime que defendia incansavelmente a moral, a família e os bons costumes, que reprimia profissionais do sexo e repugnava boates e prostíbulos por meio de um juízo moralista, do outro lado, temos um regime controlador, que lucra com zonas de prostituição. Não somente, utiliza o lucro tanto para consumo próprio quanto para a compra de armas e munição.

Em 1969, em Foz do Iguaçu, no Paraná, a dinâmica da exploração apresentada ajuda o argumento. Na usina de Itaipu, região de Três Lagoas, haviam mais de 30 mil operários. A zona de prostituição foi instalada (estrategicamente ou não) a 400 metros de um ponto de ônibus, no qual, após receberem seus pagamentos, os operários desembarcavam e rumavam para gastar seus salários na noite. Em seu auge, a zona abrigava mais de 10 mil mulheres, todas fichadas pela polícia civil do Paraná. Dessa forma, o Estado assumia o controle da zona e de seus lucros.

Em diversos estados do país, haviam incidências de prostituição controlada pelo regime. Aqui mesmo, no Distrito Federal, integrantes das Forças Armadas se envolviam e lucravam com essa prática. Um militar que atuava no Ministério do Exército, no gabinete do ministro, comandava um prostíbulo no subsolo de um edifício, no qual autorizava a entrada gratuita de seus colegas da Polícia Militar. Esta que, a propósito, estava constantemente envolvida com as zonas de prostituições.


Foto: Correio Braziliense

Um dos principais danos causados por esse grande movimento de lucratividade através de prostíbulos é o enorme aumento de crianças sem pai, uma vez que o Estado controlava o lucro, mas não controlava nem promovia a utilização e a adoção de métodos contraceptivos. Na zona de Itaipu, por exemplo, o numero de crianças registradas sem o nome do pai tornou-se cerca de cinco vezes maior, e, constantemente, diversas mulheres se viam na necessidade de recorrer ao aborto como última alternativa. Muitas dessas crianças que vinham ao mundo sofreram abandono e se tornaram órfãs, tendo em vista que o pai não os reconhecia e a mãe encontrava-se nos prostíbulos. As mazelas da ausência de paternidade e as consequências desse comércio caracterizam, certamente, algumas das sequelas irreparáveis causadas pela prática política da ditadura militar brasileira.

Foto: Jean Pavão para o The Intercept Brasil



Referências bibliográficas:


SILVA, Jhenifer . “Flores tóxicas da noite”: uma análise da prostituição em Belém durante a ditadura militar-civil (1970-1976). Cantareira. Edição n. 35 (2021)

KONIG, Mauri.Os filhos esquecidos de Itaipu .The Intercept Brasil (2021). Acesso em 02/02.<https://theintercept.com/2021/01/06/prostituicao-controlada-pela-ditadura-para-construir-itaipu-deixou-legiao-de-criancas-sem-pai/>

Prostitutas vítimas de perseguição na ditadura reivindicam anistia. Revista IHU online (2013). Acesso em 02/02. <https://www.ihu.unisinos.br/noticias/523965-prostitutas-vitimas-de-perseguicao-na-ditadura-reivindicam-anistia>

ALVES, Renato. Polícia e Forças Armadas comandavam prostituição no DF na ditadura, Correio Braziliense (2017). Acesso em 02/02. <https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2017/02/07/interna_cidadesdf,571412/policia-e-forcas-armadas-comandavam-prostituicao-no-df-na-ditadura.shtml>

The Itnercept Brasil. Prostituição controlada pela ditadura deixou legião de filhos sem pai. acesso em: <https://www.youtube.com/watch?v=d2dG1G_IMMc>


Escrito por Lara Maia, estudante de história










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